segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Meu Quarteirão X Meu Quartier



Cresci na Rua Dias da Rocha (30/902, telefone 257.3771), em Copacabana, entre os anos 60/70 e, nesta época, ainda menino, podia sair de casa para comprar sorvete e balas na carrocinha Kibon da esquina, pães doces e sonhos na Confeitaria GB, gibis e figurinhas na banca de jornal, carrinhos Matchbox e aviões da Revell na Casa Mattos e até depositar um ou outro cheque para os meus pais no Banco Real de Minas Gerais (logo redondo, dourado), em outra esquina.

Tínhamos, um pouco mais longe, na Rua Domingos Ferreira o Bob’s (o primeiro da rede) a Pizzaria Caravelle e o Restaurante Nino’s (hoje um Devassa, me parece), o Mercadinho Azul, o Casas da Banha da Siqueira Campos e os cinemas de rua, como o Rian, na Atlântica, o Metro, o Art, o Copabacana, o Roxy (salão grande, não este de hoje com três salinhas) e o Caruso, todos na Nossa Senhora de Copacabana.

As pessoas em geral, comerciantes, vizinhos, porteiros se conheciam, se falavam e se cumprimentavam e sabiam de onde você era, qual seu quarteirão, sua rua e, às vezes, até qual o seu prédio.

Infelizmente, isso mudou muito e acredito que tenha a ver com o crescimento da cidade e com o aumento da violência urbana.

Ao me mudar para Paris, em 2010, depois de 32 anos voltando apenas como turista e portanto, sem olhos de morador e, para piorar mais ainda, em outro “arrondissement” ao qual eu ainda não tinha a menor intimidade, o 5º - eu havia morado antes, bem jovem, no 16º.

Ao começar a ter que explorar a área, fui me surpreendendo com coisas que poderia supor de cidades pequenas, do interior, mesmo. Ao fazer coisas simples como cortar o cabelo, ir aos correios e à farmácia foram curiosas porque as pessoas me perguntaram se eu era novo no “quartier” (uma área de alguns quarteirões, normalmente equivalente a ¼ de um arrondissement).

Os “voiturier” de restaurantes, os donos de comércios, feirantes, todos sabem, de uma forma ou de outra, que são os moradores de determinado “quartier”.

Imaginem o meu espanto: afinal Paris recebe mais de 200 mil turistas por dia, fora a sua população de mais de 2 milhões de pessoas em seus vinte “arrondissements” (fez as contas? - são mais de 60 milhões de turistas por ano – na França toda são mais de 80 milhões).

Isso nos passa uma sensação incrível, diferente do que vemos hoje no Rio, São Paulo e até cidades menores como Belo Horizonte ou Curitiba onde mal conhecemos o comércio de vizinhança.

Tudo aqui é feito em estabelecimentos do quartier e onde acabamos sendo reconhecidos por conta da frequência e proximidade: farmácia, boulangerie, estacionamento, supermercado, correios e restaurantes, é claro.

E falando em restaurantes, vou falar de dois que adoro, o La Rotisserie (du Beaujolais, como era chamada até o ano passado) e o Le Petit Pontoise.

O Le Petit Pontoise fica no 9, Rue de Pontoise e serve uma comida francesa simples e deliciosa, em um ambiente acolhedor e pequeno: no máximo trinta e dois comensais. Sempre peço como entrada o Gratin de Ravioles du Dauphine, como prato o Foie de Veau avec du Purée Maison e, como sobremesa, um singelo Ananas Rôtie au Gingembre Confit. Para mim, imperdíveis.

O La Rotisserie fica no 19, Quai de la Tournelle e é do mesmo dono do famoso La Tour D’Argent (algo como o Antiquarius e o Da Silva).

Fica de frente para o Rio Sena e sua especialidades são as carnes vermelhas e aves como patos e frangos, tem ambiente acolhedor e seu serviço é correto. Sempre peço o Foie Gras Poêlé au Miel de amantes de entrada e como prato Demi-Poulet Roti avec du Purée Maison. Já para a sobremesa, uma incrível Tarte au Citron Meringuée.

Essa proximidade com a vizinhança me lembra a infância que tive, bem mais solta do que a nossos filhos e netos têm hoje nas grandes cidades brasileiras. Uma pena.

Puxa, nem vi a hora passar, estou de saída para almoçar.
Em qual dos dois? Semana que vem eu conto.









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