sábado, 13 de abril de 2013

Os Alpes Franceses durante todo o ano

A repórter Fernanda Dutra, de O Globo, publicou no dia 4/04/13 - 10h00 (depois atualizou no dia 12/04/13 - 21h16) no Caderno Boa Viagem / Globo Online, uma excelente matéria sobre os Alpes Franceses e as cidades de Megève e Val d'Isère, que reproduzo e recomendo a leitura, segue a peça:


Alpes no inverno e no ano todoUm roteiro por duas cidades alpinas: a tranquila e refinada Megève e a jovem e esportista Val d’Isère

A três horas de Paris, Megève é lar do único chef francês “promovido” de duas para três estrelas no “Guia Michelin”, Emmanuel Renaut

Do aeroporto da cidade, sai o sobrevoo pelos Alpes em direção ao mítico Mont Blanc

Sobrevoo pelos Alpes franceses, a partir do aeroporto de Megève, é um dos pontos altos do
roteiro pela pequena cidade a três horas de Paris, na França. Foto: Fernanda Dutra / O Globo
MEGÈVE - Nas ruas de Megève, o final da manhã é marcado não só pelo badalar dos sinos como pelo desaparecimento dos pedestres. As lojas fecham, as carruagens param. Na pequena cidade de Savoie, região no sudeste da França, moram 3.800 pessoas que recebem 90 mil turistas a cada inverno. Sem deixar os hábitos de lado. Acolhem a todos os aconchegantes e consagrados restaurantes do centro medieval e arredores com vinhos, trutas, carnes e queijos alpinos, muitos queijos.

De todos os cantos, as vistas são cênicas. Mas, de alguns, insuperáveis. Estamos, afinal, na base do pico mais alto dos Alpes, o mítico Mont Blanc — a 4.807 metros do nível do mar. Se no inverno vêm os esquiadores, no verão, os alpinistas. E, durante o ano todo, Megève, a uma hora de trem de Genebra e três horas de Paris, é um destino de escapada da cidade para a montanha, repleta de spas.

Em outra face dos Alpes franceses, a vida pulsa somente no inverno. Mas como pulsa. Val d’Isère é uma das estações preferidas dos esquiadores, lar de medalhistas olímpicos, e também das mais badaladas da Europa, com uma temporada que vai até maio. Mas quem só ensaia umas descidas pode se jogar no après-ski, que começa cedo. Às 14h, muitos esquis já estão fincados na neve, enquanto seus donos tiram as botas para dançar e bebericar champanhe, na melhor joie de vivre alpina.

Megève. Grifes locais eclipsam as de Paris

As montanhas ao redor de Megève são menos dramáticas do que bucólicas. Mas foram elas a inspiração de Jacques Reveaux para compor a melodia de “My way”, imortalizada no vozeirão de Frank Sinatra. A origem francesa do clássico talvez se perdesse não fosse a homenagem do escultor Pierre Margara ao amigo. Inaugurada em janeiro passado, a obra ganhou um lugar na entrada da cidade. É a mais recente do artista local. Trabalhando com bronze e pedra, Margara produz delicadas peças, de pessoas e animais franzinos, ainda mais frágeis diante dos Alpes. É um dos detalhes que atraem os olhos num passeio pelo centro medieval da cidade — também um indicativo de endereços tradicionais: prefeitura, hotéis e lojas, todos têm um Margara para chamar de seu.

Não que sejam necessárias muitas referências geográficas. Ao se lançar pelas estreitas ruelas medievais, basta se orientar pela torre da igreja de São João Batista. Em frente a ela, fica o ponto de carruagens — o único transporte permitido no centro histórico. Decoradas com adesivos de personagens de desenhos animados modernos, são, na realidade, uma das heranças da cidade.

Num chalé de cinco andares ao lado da igreja, uma butique da Hermès se intimida diante de uma enorme Aallard. A primeira você já conhece; a segunda, produto do terroir, precisa conhecer.

Megève era um vilarejo rural estabelecido há séculos quando a baronesa Noémie de Rothschild a elegeu para se tornar uma estação de esqui no início do século XX. Mimi, para os íntimos, queria criar uma St. Moritz francesa. Logo, a cidade se tornou um ponto de encontro dos amigos da nobre ao mesmo tempo em que o esqui se popularizou como esporte.

Voltamos então a Aallard: dono de um ateliê na cidade, o jovem Armand recebia pedidos de roupas de esqui e passou a estudá-las. Naquela época, as calças eram largas como as do belga Tintin. Aallard criou as fuseau, de tecido mais flexível e caimento mais justo. Teve a sorte de vestir um conterrâneo seu, o campeão Emile Allais, que popularizou-as no mundo. Hoje, a butique veste tanto para o esqui quanto para o après, atraindo até os menos atléticos. Cachecóis, suéteres de lã, luvas de couro, jaquetas impermeáveis e até peles fazem jus à herança perfeccionista do fundador.

Aos que não abrem mão das marcas nacionais consagradas, a dica é a Blu & Berry, com coleções de Céline, Isabel Marant, entre outras. La Maison Galliano adicionou um sotaque inglês ao centro da cidade em dezembro do ano passado.

Bem mais escondidos são os endereços gastronômicos da vila. A versão econômica de Emmanuel Renaut, o único chef francês promovido às três estrelas no “Guia Michelin 2013”, está nos fundos de sua loja de vinhos, La Cave Flocons de Sel. Detentor do BIB Gourmand, a chancela do Michelin para as casas de preços razoáveis, o bistrô Flocons Village oferece menu de três etapas por € 31. Cada um monta o seu. A dica é se preocupar com a sobremesa logo na chegada, quando deve-se pedir a torta de maçã de massa folhada finíssima, preparada na hora, servida com uma bola de sorvete.

De entrada, um suculento fricassé de escargot temperado com alho e suco de salsa ou uma sopa de cogumelos selvagens. Como prato principal, recomendamos as vieiras ou a carne bovina, ambas de origem francesa, em versões tradicionais como o tartare com batatas fritas e o cremoso risoto de limão e ervas com vieiras seladas. Caso queira levar para casa alguma das receitas, marque uma aula com Renaut por € 60 ou leve um de seus livros, à venda na lojinha.

Sob nova direção, o Le Puck, em frente à pista de patinação de gelo, vê suas mesas ao ar livre cheias nos dias ensolarados de inverno. Prove lá pratos típicos como o tartiflette ou pêla (€ 25), feito com queijo reblochon, batatas, bacon e cebolas. Para a sobremesa, procure a casa de chás Le Comptoir du Père Sotieu, com deliciosas tartelettes de mirtilo (os daqui são menores e mais doces do que os americanos), macarons, chocolates quentes e cafés num colorido ambiente de três andares.

Vale parar em outros dois endereços gastronômicos. Um deles é a octagenária Laiterie Gaiddon, repleta de tentações salgadas e doces, produzidas na região. Para visitar o outro, pegue uma das carruagens na praça e suba as ruas de um bairro residencial até o La Ferme de Joseph.

O chalé moderno abriga não somente uma loja e uma área para degustações como as vacas leiteiras, que ficam nos fundos do local, que produz queijos e iogurtes vendidos ali. Além dos vinhos, chamam atenção os potées (canela de porco, bacon, linguiça, couve, cenoura, nabo, batatas e castanhas) e as salsichas de Savoie.

Montanha. Voo nos Alpes e spas

A ansiedade pré-decolagem acometeu as quatro passageiras, como previsto. Algumas se preocupavam com o clima e as possíveis turbulências; outras, com a estrutura do avião e os momentos para fotografar e filmar. Mas quando encontramos o San Jodel D140 Mosqueteiro — modelo da década de 1950, com janelas laterais amplas e teto solar — e o piloto Roman as dúvidas se dissiparam. Nem deu para perceber o momento exato em que o pequeno monomotor de fabricação francesa, usando esquis para deslizar na neve, descolou do solo em direção ao Mont Blanc.

A vista é algo sem igual. Entre canções assoviadas, Roman nos aponta o primeiro pico: Auguille du Midi, a 3.842 metros de altura — um teleférico que sai da vizinha de Megève, Chamonix, sobe até lá o ano todo. Contornamos a primeira agulha para dar de cara com o Mont Blanc, que, dessa perspectiva, lembra mais uma bola de sorvete de flocos do que um desafio para aventureiros.

Olhar para baixo é mais emocionante: os vales de glaciares exibem um azul cristalino e sulcos profundos. Mais sortudos conseguem enxergar os cervos soltos. É mais fácil notar as modestas estruturas usadas para o pernoite na subida até o pico mais alto. Estão vazias, pois a atividade só ocorre no verão. Os 30 minutos (€ 99 por pessoa) passam, com o perdão do trocadilho, voando e logo descemos tão suavemente como decolamos. Sob bom tempo, os passeios podem ser feitos o ano inteiro.

Os primeiros voos pela cidade, assim como as primeiras descidas de esqui, se devem à baronesa de Rothschild, Mimi. Quando a nobre conheceu a cidade, notou a cunhada Nadine no livro “Megève, um roman d’amour”, elogiou “a altitude média, o clima ameno e as pistas. Em Megève, nada é bruto ou abrupto, tudo evoca um charme feminino”.

Hoje a cidade tem cem quilômetros de pistas e 27 teleféricos, alguns de fácil acesso a partir do centro histórico. Para fincar as raízes de vez na cidade, em 1924, Mimi comprou uma antiga pousada numa colina e a transformou no Hôtel du Mont d’Arbois, administrado pela família até os dias atuais. São três chalés, com 41 quartos de decoração romântica. O hotel é membro da associação Relais & Chateaux — assim como o Flocons de Sel, nas montanhas, de Renaut.

Outra mulher a quem Megève deve sua fama é Jocelyne Sibuet. Partiu dela a decisão de instalar um spa no hotel recém-criado com madeira de chalés antigos, o Les Fermes de Marie, de 1989. Essa foi a origem da marca de cosméticos Pure Altitude, cuja base é a flor alpina edelweiss, atualmente usada em oito spas próprios (metade deles fica nos hotéis do grupo na cidade) e à venda nas farmácias. O maior deles ainda é o original, com 17 salas de tratamento, piscina aquecida e jacuzzi interna e externa. Peça as salas do subsolo, pois as do térreo são barulhentas, para provar tratamentos antienvelhecimento — os produtos de Sibuet são reconhecidos por isso.

Além dos Pure Altitude, há outros seis spas na cidade, e diversas empresas, e profissionais que atendem nos hotéis. Mesmo visitando Megève no inverno, é capaz de se esquecer que está tão perto de estações de esqui.

Serviço:

PasseiosSobrevoo: A Aérocime levanta voo com no mínimo duas pessoas, de € 34 (10 min) a € 134 (40 min) por pessoa. aerocime.com
Esqui: Até o próximo dia 21 de abril. O passe diário sai por € 41,50. Seis dias, € 195. forfaits-megeve.com

FeiraÀs sextas de manhã.

Onde comer
Flocons Village: 75 Rue Saint-François. Reserve mesmo no almoço. floconsdesel.com
Le Puck: 31 Rue d’Oberstdorf. Esplanade de la Patinoire. lepuck-megeve.fr
Le Comptoir du Père Sotieu: Rue du Général Muffat St Amour. Tel. 33 (4) 5021-6751

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